sábado, 30 de outubro de 2010

A chance perdida. Sem lembrar que o estado é laico, fomos às profundezas do atraso.

Sempre vejo campanhas políticas como uma oportunidade para o debate e a possibilidade de convencer as pessoas a pensarem uma sociedade melhor, com base em questões filosóficas. Talvez por isso, termino esta campanha com alto nível de frustração. E não importa quem perde ou quem ganha nesta análise. Perdemos todos e todas.

A imprensa (e as raras exceções não gritaram, apenas sussurraram), estava comprometida. Todos nós jornalistas tínhamos um lado. Os motivos são vários e ficam para outro artigo. Ninguém se importou com veracidade de notícia e nem em ouvir o lado acusado. As matérias foram jogadas nos sites do mesmo modo que vinham das assessorias. De um lado e de outro. Por aqui precisamos aprender outro jornalismo. Não consta em nenhum manual ou aula. Por vezes, fica surreal.

O ápice da loucura

Mas, o mais importante mesmo foi a chance perdida no debate político. O ápice dessa loucura coletiva foram as “denúncias” da religiosidade de um candidato. Com essa linha, foi perdida a oportunidade de ouro de derrotar o tal candidato com a sua própria trajetória. E havia muito para ser dito. Desde as irregularidades em compras suspeitas de terras, até sua conduta questionável diante de “companheiros” de partido e a dificuldade em cumprir acordos políticos.

Mais que isso. Há a violência contra ambulantes, a demissão em massa dos agentes de saúde, inclusive com denúncias de sindicâncias fraudulentas. E os fiteiros, com pontos há mais de trinta anos, removidos por tratores. Feirantes obrigados a pagar por reformas feitas pela prefeitura da capital. Igrejas sendo despejadas. E até viagens sem sentido, com dinheiro público, para a Europa. Isto sem falar da opção descarada de inventar uma mentira, como a da confraria, prejudicar vidas e nela permanecer, como se fora verdade.

E na campanha, o candidato inaugurou as apreensões da Polícia Federal que estourou comitê com muito dinheiro, sabe-se-lá-pra-quê. Tem até cheque pré-datado nas denúncias mais recentes, ressalvando que copio a notícia de sites, que não sei se foram checadas.
E o outro candidato? Vou falar apenas do personagem dos tais panfletos. Em artigos anteriores já abordei problemas da outra campanha, a exemplo do artigo: Cuidado, patota! O Universo conspira. Confira. http://migre.me/1Sy0d . E dizem os sites, há dinheiro em cueca e tudo.

A defesa que não veio

Mas, voltemos ao panfleto falando de religião. Oportunidade perdida. Ainda assim, pensei: O candidato vai deitar e rolar. Vai defender as matizes religiosas
africanas. O provo negro, por conseguinte. Vai defender os artistas, a diversidade, as preferências religiosas como um direito inalienável do ser humano. Mas nada.

Ao contrário, assisto perplexa ao candidato indo à igreja, onde jamais esteve, ajoelhando e recebendo ‘a benção. Com todo o respeito, mas não era hora de demonstrar sua simpatia por esta ou aquela igreja. Mesmo porque ela não é verdadeira. E parece até que a carapuça serviu. A hora era de reafirmar que o estado é laico, o governo tem de ser laico e que uma sociedade não pode escolher seus representantes com base em religião.

Aliás, esse candidato pode até ser ateu, desde que defenda os interesses do povo. Afinal, ele não é candidato a papa ou ministro do evangelho ou rabino ou babalorixá ou sei lá eu. E se tivessem acusado esse homem de ser gay? O que teria sido. Não quero nem pensar.

Nas profundezas

A falta do debate e a opção do candidato de tentar ganhar a eleição a qualquer preço, nos levou para as profundezas do atraso. E já nas profundezas, sem chance de alcançarmos o paraíso, vem uma “carta ao povo de Deus” ( copiando idéia da atrasadíssima Dilma). Pronto. Agora só na próxima encarnação teremos uma chance de refazer o caminho.

Perdemos. E seja qual for o candidato que vença as eleições, de certo mesmo só temos a certeza de que vamos ter de começar tudo de novo. Voltamos à estaca-zero. E já recomeçando, porque esse princípio filosófico não pode esperar, O ESTADO É LAICO.

Tudo bem. Como diria meu poeta, Bala Barbosa, “ Às vezes voltar é seguir em frente. O sol sempre volta e define o dia”.

Menção honrosa

E no jornalismo, menção honrosa para o sempre jornalista Walter Santos, para Josival Pereira, que não abriu mão de discutir outros assuntos, que não fosse campanha; Paulo Santos, que mantém a serenidade, para Walter Galvão, que até mandou publicar a agenda das várias religiões, para Beth Torres – que é democrática, Gisa Veiga, que avaliou os debates com isenção, Helder Moura, que publica as porradas que a coluna leva e Tião Lucena, por seu impagável humor, que eu mesma, outrora, já interpretei mal.

Lídia Moura
lidiamouras@uol.com.br

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